Repórter Lamharck Dias no momento da entrevista ao professor José Cícero
AURORA - Prestes a ganhar a sua 1ª emissora comercial em freqüência modulada (FM) 91.1, cuja inauguração está prevista para os próximos dias o EITA AURORA através do seu repórter Lamarck Dias resolveu entrevistar o secretário de cultura do município, o professor José Cícero acerca desta grande novidade.
A referida entrevista aconteceu no último feriadão de carnaval na residência de JC, ocasião em que foram abordados vários assuntos relativos ao tema, assim como outras considerações sobre a implantação da emissora de rádio na cidade. O entrevistado também se reportou a uma série de reflexões sobre os rumos atuais da comunicação brasileira e da radiofonia em especial.
No início dos anos 2000 José Cícero foi um dos principais articuladores quando da criação da primeira emissora de rádio da história de Aurora – a rádio comunitária Aurora FM 97.1, então vinculada à associação comunitária Pe. Francisco França. Onde ao longo de mais de meia década atuou como diretor de programação e também como apresentador de programas jornalísticos e musicais, tais como: Jornal do Meio Dia, (redator e apresentador: primeiro com Zilda Coelho, depois com Luiz Neto(Netão). Ainda, dos programas diários de MPB – “Almoço Musical”, Show de Variedades, incluindo os finais de semanas com: Freqüência Brega, Embalos da Jovem Guarda, Acervo Musical, além da apresentação aos sábados do programa de entrevistas – ‘Debate Popular’. Também participou da histórica transmissão futebolística(no antigo Romãozão) como comentarista esportivo com Luiz Neto - a 1ª feita por uma emissora local na partida entre a seleção de Aurora versus Guarani de Juazeiro. E noutra ocasião ao lado do imortal Francisco Silva(o foguinho) na sua última passagem por Aurora.
Uma experiência que, segundo ele, muito positiva no aspecto da compreensão e da aprendizagem de uma mídia das mais antigas que, mesmo com o grande avanço tecnológico atual, ainda resiste e se constitui como uma ferramenta imprescindível para o desenvolvimento da sociedade. Principalmente nos municípios interioranos onde a informação encontra-se cada vez mais empastelada por força de uma imprensa meio que alienígena altamente padronizada, vindo de cima para baixo.
E como ele mesmo diz, quase sem nenhum compromisso com o processo sociocultural e educacional do país. Uma imprensa de elite feita muito mais para desinformar e, portanto, descolada demais dos verdadeiros interesses das grandes camadas sociais.
Confira a entrevista a seguir:
EA - Professor José Cícero qual a importância de uma emissora como esta para o nosso município a partir de agora?
JC – No contexto de um mundo dito moderno e globalizado, onde infelizmente as identidades culturais principalmente interioranas estão sendo esquecidas e colocadas pra trás, diria que a comunicação sobre qualquer aspecto é fundamental. Notadamente quando se propõe a ser construída pela própria comunidade. Principalmente que se propõe a resistir ao que nos vem de fora. E o rádio por sua vez, ocupa um lugar de destaque neste processo, visto que passa a ser como nos velhos tempos, um instrumento de identidade e afirmação da nossa realidade, diante de tudo aquilo que é artificial que ‘eles’ nos mandam lá de fora, como se diz: goela abaixo, sem nenhuma identificação com as nossas aspirações coletivas.
Um canal como este, penso que é uma maneira de quebrarmos esta padronização que não nos faz bem. Diria ainda que projetos como este, é uma luz que se acende no fim do túnel. Uma alternativa a toda esta enxurradas de baboseiras que ora se ver e se ouve por aí.
A boa rádio no momento atual, ao contrário de outros tempos, não será mais aquela que rompia grandes distâncias, mas aquela que conseguirá fazer diferente, ou seja, falar regionalmente do nosso cotidiano. Das nossas ânsias e angustias ante a nossa própria línguagem, conseguindo assim captar as necessidades e os sentimentos do seu povo. Num modelo de comunicação social, que possa agregar num só espaço os principais valores da nossa sociedade com uma atitude de reafirmação da nossa cidadania. Agora, para que isso aconteça a contento, é preciso a junção de dois fatores: Visão de mundo, inteligência e capacidade para ousar sempre.
EA - Como seria possível fazer este tipo de rádio diferente? Sem ter que cair nisso que você chama de ‘padronização’?
JC – Ora o primeiro passo já foi dado. O mais difícil creio que seria conseguirmos a concessão, além dos recursos financeiros para colocá-la em operação. E isso já sendo feito pelo prefeito Adailton – que por sinal, tem demonstrado ser um cara realmente de visão. O que por sinal, (infelizmente) vem causado um mal-estar tremendo naqueles que se dizem seus adversários. O que é uma pena lastimável. Posto que, o que está efetivamente em jogo, é o futuro do desenvolvimento do nosso município como um todo.
A vontade coletiva tem que, necessariamente, que está acima dos interesses individuais e politiqueiros. E mesmo em se tratando de uma emissora privada, penso que há sem sombras de dúvidas, um componente social a ser desempenhado. Isso é que chamamos de contrapartida social a que todo meio de comunicação deveria exercer.
A boa rádio, portanto tem que ir muito mais além do “feijão com arroz”, ou seja, do entretenimento musical sofrível. A rádio tem que ser fundamentalmente irradiadora de informação construtiva, de conhecimento, difusora de cultura, educação, saúde e cidadania. Esta terá que ser a rádio do futuro. Grosso modo, uma boa informação democratizada pelo rádio, não deixa de ser um propulsor de desenvolvimento social dos mais consideráveis...
Não acredito naquilo que não ajuda as pessoas a evoluir. Assim como no que contraria os nossos valores. No que não tem cultura, conhecimento e nem educação. E na prática, com raríssimas exceções, é isso que vem acontecendo hoje com a maioria das emissoras de rádios e muito especialmente com mídia, sobretudo a televisiva – um prejuízo escancarado. Estamos passando por uma verdadeira hecatombe cultural. De modo que não seria interessante para ninguém a reprodução deste status quo. De sorte que estou confiante que isso não ocorrerá em Aurora.
EA – E como fica a questão da Audiência?
JC - Não fica. Terá que ser conquistada por mérito. Caso optemos pelo lugar-comum, isto é, com esta preocupação estéril da audiência a qualquer custo, fatalmente daremos apenas continuidade ao que já temos de ruim, além da conta... Razão pela qual proponho a quebra deste vergonhoso paradigma, ou seja, a ruptura com esta infeliz “padronização comunicativa”. O que considero uma mesmice das mais contraproducentes. Presumo que a rádio alternativa é a melhor saída por uma séria de problemas relacionados ao nosso cotidiano social. As rádios do Brasil vivem uma crise de despreparo e de identidade a meu ver sem nenhum paralelo na história.
Mas é bom que se diga que isso é algo que pode ser feito de forma gradativa. Um processo gradual. Mas, é imperioso que haja efetivamente espaços para formatos diferenciados na grade de programação. Que combatamos os enlatados, o mau gosto, o vazio informativo e criativo, assim como a música de péssima qualidade e descartável. Aquela que “eles” chamam de sucesso que de tão ruim, não deveria sequer ser chamada de música. Que haja um compromisso com os nossos valores éticos, artísticos e culturas.
Agora, é óbvio. É preciso não perder de vista a qualidade. Há que haver critérios e com certa rigorosidade... Contudo, não se pode vender a alma ao diabo em nome da audiência pura e simples em detrimento da sociedade e das coisas que realmente edificam...
Acho que é um erro pensar que a comunidade ouvinte não tem bom gosto. Assim como é um equívoco sem tamanha a idéia de nivelar por baixo o desejo de informação das pessoas. E é isso que infelizmente vemos nos meios de comunicação do Brasil de um modo geral e do Nordeste em particular.
Acho tudo isso um desserviço que se presta ao país. E praticado, por exemplo, por uma concessão publica configura até um crime, posto que a informação é uma ramo estratégico para a formação da identidade do povo brasileiro. Além de um direito de todo cidadão. Por fim direi que, toda padronização é danosa e portanto, contrária a natureza, visto que dentre outras coisas, prejudica a pluralidade das coisas e do pensamento criativo.
EA – Mas como fugir do atual padrão de programação, inclusive musical que atualmente vem sendo popularizado pela maioria das emissoras de rádio que se ouve?
JC – A primeira coisa que se deve fazer para mudá-lo é ter disposição para tal. O grande problema é o esquema quase demoníaco montado pela grande mídia. Os poderosos do ramo e o próprio mercado fonográfico que só enxergam dinheiro. E as rádios estão sim dando vazão a este verdadeiro lixo musical que contribui para o atraso da nação, naquilo que ela tem de mais valioso que é a cultura da sua gente. E o pior é que estamos pagando caro por tudo isso.
De modo que, penso que o segredo, não tem jeito: é fazer diferente. Do contrário, não seremos nenhum opção ao público ouvinte. Ou se faz isso ou ficaremos igualzinhos a todas as outras. Então qual seria a novidade? Que opção, que alternativa os ouvintes teriam senão cair no lugar-comum? Só a qualidade é que fará a diferença. Sem estas atitudes seremos apenas mais “Uma”(rádio). Na pior das hipóteses, eu até digo: Tudo bem, se você insiste em tocar uma música, feia, obscena, antipoética e macarrônica. então, pelos menos permita que haja igualmente espaços para outras iniciativas. Que a boa música do Nordeste e a MPB, por exemplo, também possa ser veiculada diariamente em horário nobre.
Que ofereça alternativa para seus ouvintes. Que haja espaço para os chamados “artistas marginais” que eu considero verdadeiros herói dada a resistência. Isso é o que eu chamo de respeito ético. Até porque as pessoas não aprendem a gostar daquilo que não conhecem. Por que será que os Europeus, em especial os alemães e os franceses gostam tanto da música erudita? Ora, as rádios de lá tocam o tempo todo. E a música há muito constitui uma disciplina presente no currículo escolar. Por sinal, uma disciplina das mais prazerosas. É triste saber que muitos por aqui sabem muito sobre Madona, Bionce, e nada sobre Jackson do Pandeiro, João do Vale, Vanessa da Mata, Zeca Baleiro só para citarmos alguns. Ah, antes que eu me esqueça. Sabe-se muito sobre as bandas de forró que não se prezam sequer na escolha dos títulos que escolhem para seus nomes... Eis aí a sentença do “quanto pior melhor”. Não podemos achar nada disso normal.
Que ofereça alternativa para seus ouvintes. Que haja espaço para os chamados “artistas marginais” que eu considero verdadeiros herói dada a resistência. Isso é o que eu chamo de respeito ético. Até porque as pessoas não aprendem a gostar daquilo que não conhecem. Por que será que os Europeus, em especial os alemães e os franceses gostam tanto da música erudita? Ora, as rádios de lá tocam o tempo todo. E a música há muito constitui uma disciplina presente no currículo escolar. Por sinal, uma disciplina das mais prazerosas. É triste saber que muitos por aqui sabem muito sobre Madona, Bionce, e nada sobre Jackson do Pandeiro, João do Vale, Vanessa da Mata, Zeca Baleiro só para citarmos alguns. Ah, antes que eu me esqueça. Sabe-se muito sobre as bandas de forró que não se prezam sequer na escolha dos títulos que escolhem para seus nomes... Eis aí a sentença do “quanto pior melhor”. Não podemos achar nada disso normal.
EA – É possível fazer este tipo de comunicação radiofônica aqui em Aurora?
JC – Evidente que sim. Olha. como nada acontece por acaso. Também não ocorre da noite para o dia. É preciso dá tempo ao tempo. Um século para a história é apenas um segundo. De sorte que eu, particularmente não me preocupo tanto com as questões cronológicas, temporais... Por isso mesmo, eu acredito nas ideias e nos projetos alternativos. Em tudo que é ousado, porque combate e desafia a mesmice...
Se já perdemos muito tempo, não significa que não sabemos a partir de agora esperar para em seguida darmos um passo largo e de qualidade. Por que não? A paciência é uma grande virtude do ser humano. Aprendi isso com os grandes pensadores asiáticos e orientais. A pressa, portanto, na maioria das vezes nos leva a precipitação e ao engano. Por isso é sempre conveniente e providencial saber o tempo certo. Temos que pensar nas nossas ações como uma semente que jogamos em solo fértil e que as gerações do futuro terão de regar e colher seus frutos. Acho que este momento de agir e semear já chegou em Aurora não apenas no tocante ao rádio.
Isso é o compromisso que haveremos de manter impreterivelmente com o presente em nome e em favor do futuro... E mais: Isso não vale apenas para a questão da comunicação radiofônica. Isso vale para tudo na vida. Temos que acreditar nas coisas novas, assim como sempre numa mudança possível. Claro, mas sempre para melhor.
EA – Qual a razão desta sua imensa admiração pelo rádio e pelo novo?
JC – O rádio, assim como o livro, penso que foi até hoje uma das mais fantásticas invenções do homem. Os serviços prestados pelo rádio ao crescimento evolutivo da civilização humana são simplesmente incomensuráveis. Então, não tem como não sermos fascinados por este instrumento de comunicação de massa. E agora com o desenvolvimento tecnológico o rádio só tem evoluído mais e mais. Em resumo, todos os seres humanos em especial aqueles que de algum modo lidam com a palavra, numa profunda perspectiva histórica deveria manter viva dentro de si esta afetiva relação de amor com o rádio. E acho que é exatamente o sentimento que tenho pelo rádio e pela comunicação em geral. Agora, há que ressaltar que o rádio por si mesmo não passar de um mero instrumental. Por conseguinte, ele é exatamente aquilo que faremos dele. Se uma emissora é de qualidade duvidosa, ou não cumpre o seu papel – diríamos que a culpa não é do rádio e sim daqueles que o fazem no seu dia a dia. Como se diz: Não podemos culpar a janela pela paisagem que vemos através dela.
EA – Da época em que você atuou na 1ª emissora de rádio de Aurora até hoje o que realmente mudou em se tratando de comunicação radiofônica?
JC – Olha, creio que cada momento histórico tem seu papel. Naquela época as instalações de emissoras comunitárias se transformaram numa verdadeira coqueluche( este termo ainda existe?) não somente pelo Ceará. Aqui mesmo nós tivemos, além da Aurora FM que foi, por assim dizer, a pioneira por ter sido a primeira ainda: a Beija-flor e a Vale do Sol sem esquecer a que existiu no distrito de Ingazeiras(que agora não recordo o nome).
Penso que todas elas de certa forma, independente das suas debilidades, cumpriram seu papel. Muitos aprenderam outros se decepcionaram, porém no final das contas, a comunidade aprendeu ainda mais a dá importância a este tipo de comunicação. Foi a fase diletante do mais profundo amadorismo do rádio aurorense. Uma fase das mais românticas que vivenciamos e compartilhamos com a população. Algo inesquecível. Mas que não deixou de ser um aprendizado importante sob os mais diferentes aspectos.
De lá pra cá muita coisa mudou – nenhum delas existem mais. Porém a necessidade de uma emissora séria, sólida, profissional e inteligente ainda continua sendo um desejo por acontecer concretamente. Quem sabe uma emissora que tenha a cara da nossa gente. Que expresse na sua programação cotidiana os nossos valores e que não fuga do seu compromisso social, cultural e educativo como diretrizes imprescindíveis a uma comunicação democrática, assim como ao de desenvolvimento e consolidação da nossa própria cidadania. É isso aí...
EA - Este formato de programação que você defende já não deveria está sendo desenvolvido pela emissora que já existe de Aurora? Até porque ela é de caráter Educativo. Qual a sua opinião?
JC – É evidente que sim. Deveria, mas infelizmente não o é. E olha que estamos falando de uma concessão pública com finalidade específica voltado para à educação e a cultura. Mas sem dúvida tem a sua importância no nosso contexto. Não podemos negar este aspecto. Por outro lado, quem já fez rádio sabe das enormes dificuldades e das debilidades de toda sorte. Inclusive as ingerências políticas... É preciso, portanto levar tudo isso em consideração. O que não podemos admitir é o descaminho da missão legal, assim como do verdadeiro papel social a ser desempenhado em favor da nossa municipalidade. Mas como temos que manter o otimismo, eu acredito e tenho esperança sim de que possa haver um novo direcionamento no sentido de uma programação construtiva e culturalmente dinâmica que possa fazer frente ao descartável da mídia marrom por este Brasil afora.
Quem sabe, como mais uma forma de combater o verdadeiro caos que existe por este país a fora. Para tanto, qualidade não é uma coisa estanque ela se dá a partir de capacitação, da busca de conhecimento. Assim como de informação e muita leitura. Do contrário é como si diz: “malhar em ferro frio”. Não nos esqueçamos que as coisas boas também dão trabalho para serem formatadas... De forma que a lei do esforço mínimo atrapalha bastante.
JC – Claro. Como já disse anteriormente e reafirmo, tanto o otimismo quanto a esperança no novo e no futuro são coisas que constituem todo o horizonte da minha visão. Como de resto, sou um diletante da palavra e o rádio com um grande veículo de comunicação de massa está fatalmente inserido nesta minha concepção. E a palavra em última análise, é toda a argamassa da comunicação (compreende?).
Desta maneira é que me sinto bastante contente e motivado diante desta obra fenomenal que é a conquista de uma emissora de rádio para nosso município. Sabendo igualmente que o rádio ainda hoje é uma ferramenta que muita nos ajudará a transformar para melhor a nossa sociedade. Uma maneira de projetar nossas experiências e nossas idéias ao além-fronteira. Uma maneira definitiva de inserirmos Aurora na agenda cultura e política do Cariri como um município próspero, moderno, social e culturalmente justo e democrático.
Portanto estou como todos, na expectativa. Que venha nossa emissora. Em resumo direi ainda que, confiamos sempre nas boas idéias como ingredientes para qualquer transformação engrandecedora. Esta emissora será um marco...
Um povo sem uma rádio forte e consistente é um povo sem vez e sem voz. Aurora está de parabéns por mais esta conquista história, em cuja oportunidade aproveito(se você me permite) para igualmente agradecer ao Sr. Prefeito Adailton Macedo pela luta que sei que não foi nada fácil.
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Fonte: http://www.eitaaurora.blogspot.com Por: Lamhack Dias
Créditos das fotos: Jean Charles, Karlos Marx e arquivo pessoal jc
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